domingo, 23 de novembro de 2014

Pó Mágico para emagrecer - segredos do Whey


Durante a adolescência, os apelidos mais carinhosos que Daniel Bastos recebeu foram “fofinho” e “pão de queijo”. Nessa época, o estudante de Relações Internacionais chegou a 106 quilos, numa proporção não tão bem distribuída em 1,70m de altura. Dois anos atrás, ele resolveu perder o peso que tanto o incomodava. Pesquisou sobre dietas na internet, criou o próprio cardápio, cortou os carboidratos depois das 18h e acabou enxugando as medidas. Mas o corpo ideal, ele diz, só conseguiu mesmo depois de incorporar uma rotina regular de exercícios, sempre finalizada com uma espécie de pó “mágico”.

— Passei por uma mudança radical e, no início, me sentia muito cansado. Foi quando eu me rendi ao whey protein e comecei a tomar depois dos treinos — garante Daniel Bastos, 23 anos, hoje com 72 quilos, apenas 8% de gordura corporal, sobre o suplemento que é elaborado a partir da proteína extraída do soro do leite e diluído em água ou suco antes do consumo.

Discursos como o de Daniel são repetidos por frequentadores assíduos — e nem tanto — das academias. Apesar do preço alto (dependendo da marca, um pote de quase um quilo pode custar até R$ 400) e da indicação para atletas com “A” maiúsculo, o consumo de whey protein cresceu sem controle, virou modismo e abriu até uma rota de contrabando no país. No mês passado, uma empresária de 26 anos foi presa no Galeão com R$ 25 mil em quilos da proteína e de outros suplementos que trazia de Miami, nos Estados Unidos — onde é comercializado por, pelo menos, um terço do preço cobrado por aqui —, e oferecia pelas redes sociais.

De acordo com dados da Associação Brasileira dos Fabricantes de Suplementos Nutricionais e Alimentos para Fins Especiais (Brasnutri), o whey protein, em diversos formatos (pó, barra de cereal etc.), corresponde a 60% das vendas de seu segmento, ou seja, é o recordista no Brasil. Em tempo: a indústria de suplementos alimentares faturou R$ 1 bilhão no ano passado e prevê crescimento de 10% ainda em 2014.

De assunto nas salas de musculação, o whey (como chamam os aficionados) foi parar na cozinha. Ao lado de ovos, açúcar e fermento, virou ingrediente de pratos como bolos, tortas e pães. As receitas, nem sempre tão saborosas, são compartilhadas e se multiplicam na internet.
Patrícia Helu tem uma conta no Instagram com mais de 30 mil seguidores que curtem cada foto de prato novo que ela inventa. Nem todo mundo imagina que, até o ano passado, a chef de cozinha, vegetariana e adepta da dieta funcional fumava um maço de cigarros por dia e fugia de qualquer atividade física.

— Resolvi correr atrás do prejuízo e testar algumas receitas. Posso garantir que tudo com whey vira o maior sucesso. Dá para agradar todos os gostos com pão de abóbora, trufa de tâmaras e até churros com calda de chocolate — enumera Patrícia, autora de receitas que conquistaram gente como a musa fitness Carol Buffara.

Doceira de mão cheia, Ana Foster criou recentemente uma linha para atender clientes que, como ela, preferem evitar o açúcar. São guloseimas com alfarroba de avelã, banana e crispy de aveia, pinhão e, claro, whey protein. O formato do docinho com recheio de brigadeiro é igual àqueles que transbordam calorias. As diferenças estão nos ingredientes e na “decoração’’ especial, com desenhos de halteres ou de um muque.

— Faltavam opções para convidados de casamentos e aniversários que vivem de dieta ou que têm restrição alimentar. A maior parte da linha é sem glúten e lactose, mas as receitas com whey foram tão bem recebidas que não paro de pensar nas próximas combinações — conta Ana, 29 anos, formada em Nutrição, namorada de um fisiculturista e responsável por uma produção mensal de cerca de cem mil doces e chocolates.

Sem esforço, não há whey protein que faça milagre. Os especialistas dizem, inclusive, que o uso regular do suplemento por quem não pratica exercícios físicos pode não ter relevância alguma. A sugestão é sempre a mesma: basta seguir uma alimentação balanceada, que inclua um cardápio de opções saudáveis. Boas fontes de proteína, como um bife, são mais do que suficientes para os não-atletas. Já entre os mais ativos, adeptos de atividades físicas intensas e com frequência regular, estudos mostram que as proteínas ajudam, sim, na recuperação e construção dos músculos, e que a melhor indicação é o consumo logo após o treino (pesado).

— O whey protein contém uma proteína de alto valor biológico e de rápida absorção, e é indicado para auxiliar no ganho de massa muscular entre quem pratica atividade de alto ou médio impacto — explica Lúcia Flávia Ramalho, endocrinologista do Hospital Adventista Silvestre. — Quando acontece, a perda de peso se dá, principalmente, devido à sensação de saciedade que o produto oferece.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) enquadra a proteína como um alimento, e não medicamento, e marca em cima das empresas brasileiras. Só neste ano, mais de 20 lotes tiveram distribuição e comercialização vetadas. O maior problema era o desencontro de informações entre a quantidade de carboidratos e de proteínas presentes nos produtos e a que era declarada nos rótulos.
— O acompanhamento de um nutricionista é fundamental para evitar qualquer problema — ressalta Gabriel Alvarenga, coordenador do setor de nutrição das unidades Bodytech Rio de Janeiro e Brasília. — Este é um produto com calorias semelhantes as dos carboidratos e seu uso exagerado pode provocar aumento de peso. Além disso, quem tem intolerância à proteína do leite pode sentir inchaço, apresentar problemas intestinais e desenvolver até processos alérgicos. É recomendável fazer exames clínicos e laboratoriais.

Longe do mundo dos pesos, anilhas e caneleiras, pouca gente sabe, mas o whey protein também tem indicações médicas. Pode ser recomendado, por exemplo, em casos de desnutrição, emagrecimento excessivo e até como auxiliar em tratamentos de câncer.

De olho no interesse crescente pelo produto, empresas do ramo de suplementos, e também de fora dele, usam e abusam da imaginação para lançar uma série de produtos com a proteína na fórmula. Tem cupcake, barrinha de cereal, musse de chocolate, cookie, sorvete, cereal, sucos, cappuccino com canela e macarrão.

Apesar das novidades, nada chega perto de ameaçar o lugar do produto original, em pó. Entre os adeptos, não existe qualquer regra na utilização. Há quem beba antes ou depois das atividades físicas; há quem prefira meia hora antes de dormir; logo depois de acordar; e aqueles que escolhem todas estas opções. Na maioria das vezes, sem qualquer orientação de um profissional especializado.

A atriz Joana Gervais, 27 anos, é mãe de Eva, de seis meses. Durante a gestação, engordou 30 quilos (“tudo era desculpa para comer”, lembra). Quando a filha completou três meses, ela voltou a fazer exercícios e também resolveu trocar o jantar por uma dose de whey protein misturada à água.

— O meu marido toma há anos e nunca entendi direito para que servia aquilo. Mas aí uma amiga me disse para experimentar porque com certeza eu secaria. É claro que não é tão simples assim, mas a sensação é que a minha fome está mais controlada — comemora Joana, que segue tomando a misturinha depois dos treinos funcionais que faz religiosamente três vezes por semana.

Diretor da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE), Jomar Souza condena o consumo indiscriminado do produto e faz um alerta aos empolgadinhos de plantão.

— Há riscos com o uso abusivo de proteínas, que pode sobrecarregar o fígado e os rins e interferir na função destes órgãos. Se a pessoa vai se submeter a um treinamento intenso que justifique o uso deve fazer uma avaliação médica e nutricional para determinar exatamente que quantidade e quando o suplemento deverá ser utilizado — afirma o médico do esporte.




A estudante do terceiro período de Medicina Giovanna Noleto, 20 anos, contou ter pesquisado bastante sobre o tema antes de incorporar a proteína à rotina. Para ela, é uma combinação perfeita para potencializar o treino intenso: três dias por semana dedicados a musculação e dois a exercícios aeróbicos, como esteira e transport.

— Experimentei pela primeira vez há dois meses e agora levo até barrinhas de proteína para o lanche da tarde, na faculdade. Quando tenho tempo livre, gosto de inventar receitas com o suplemento. A minha especialidade é a panqueca — conta Giovanna.




Ex-gordinha e hoje com um corpo torneado à prova de celulite mesmo quando veste legging branca, Lilia Lima, de 36 anos, virou a própria garota propaganda dos doces e salgados que faz em casa e vende pela internet e em academias de Copacabana, bairro onde mora.

— Quem falou que não dá pra manter a forma com beijinho de coco? — pergunta Lilia, que largou o emprego de vendedora de loja para passar horas na cozinha e faturar até R$ 3 mil por mês. — É o que eu digo sempre: whey bom é whey caro, por isso que, para mim, a qualidade vem em primeiro lugar. Capricho porque nunca vi tanto interesse de pessoas tão diferentes. Tenho mais é que aproveitar.

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